Editorial
Resumo
O número 54 da Revista Lumen Veritatis é um exemplo do labor científico levado adiante pela “universitas christiana” em diversas áreas do conhecimento, abarcando tudo com sabedoria, competência e bom senso.
O volume atual inicia-se com um artigo da área bíblica a respeito da vocação de Jeremias. Segue-lhe outro sobre a atualidade da filosofia de São Tomás e, de maneira mais específica, das vinte e quatro teses tomistas. Em seguida, são oferecidos dois trabalhos jurídicos de exegese canônica, de vivo interesse. Para concluir, há um artigo de Bioética acerca da eutanásia, tema de pungente atualidade.
O primeiro texto, de autoria do Prof. Alejandro Javier de Saint Amant, EP, biblista e colaborador assíduo da Revista, versa a respeito da perícope do livro de Jeremias (1,4-19), o relato vocacional do profeta.
O Autor comenta a experiência única e sobrenatural do chamado à profecia, num tempo de lamentável decadência do Povo Eleito. O Profeta terá de enfrentar o conflito com a sociedade e a perseguição dos nobres. Será o profeta duro como rocha, capaz de resistir a todas as perseguições por parte dos seus. Em conclusão, o Autor nos transmite a mensagem que nos deixou Jeremias e quais aplicações podem ser feitas para os crentes de hoje.
O Prof. Fabrizio Cambi, da Ordem dos Pregadores, nos oferece um estudo de fina agudeza a propósito da expressão “Patrimonium Philosophicum Perenniter Validum” utilizada na Gaudium et spes e na Veritatis gaudium. O Dominicano mostra com clareza a relação desta expressão com o Magistério Pontifício pré-conciliar de fins do século XIX (Aeterni Patris de Leão XIII e sucessores) até meados do século XX. De modo particular, a relação da mencionada expressão latina com as vinte e quatro teses filosóficas tomistas propostas no pontificado de São Pio X e confirmadas por diversos de seus sucessores.
Em “Diritti acquisiti e privilegi: commento sistematico-esegetico al can. 4 del CIC/83, o Prof. Esposito, OP, nos apresenta considerações utilíssimas para a ciência jurídico-canônica. Partindo de comentários aos cânones preliminares do Código latino, segundo o método sistemático-exegético, o Autor se ocupa do estudo da primeira parte do cân. 4 sobre os direitos adquiridos. Em termos concretos, analisa-se a relação entre o CIC/83 e os direitos adquiridos, antes de sua entrada em vigor.
O trabalho destaca o estreito vínculo existente com o cân. 9 e a necessidade de combinar a regra da irretroatividade da lei com a exceção da retroatividade, quando é explicitamente (nominatim) estabelecida pela lei. Finalmente, evidencia a noção de privilégio no Direito, especialmente no enfoque canônico, cuja finalidade é a salvação das almas.
No artigo “Os meios de sustentação da Igreja, o dízimo católico e a correta compreensão do recolhimento de ofertas – stipem cogere – regulado pelo cânon 1265”, o Prof. Barbosa de Brito, EP, retrata a realidade eclesiológica relacionada com o dízimo e outras atividades de coleta de donativos. Segundo o Autor, o dízimo (colaboração com a igreja particular, dada pelos fiéis conforme as próprias possibilidades) não é a única forma de contribuir com as necessidades da Igreja. Os aportes para obras e associações privadas não se caracterizam como dízimo, ainda que sejam mensais, tampouco estão reguladas pelo cânon 1265, uma vez que não se trata de coletas próprias a ordens mendicantes, as quais dependem da licença do Ordinário do lugar.
O Prof. Zuleta e a Prof. Ovalle Pinzón, no artigo “Atualizações para um diálogo realista sobre a eutanásia”, inicialmente nos apresentam um estudo sobre a realidade social da eutanásia na Holanda e na Bélgica, países paradigmáticos que inspiraram e inspiram até hoje os projetos de legislação em outros países. Segundo os Autores, a prática da eutanásia nesses países é baseada na evolução de critérios para sua aplicação, que se inicia como desejo voluntário do paciente ou em caso de doença terminal; mas se dirige a uma aplicação que se abre cada vez mais para o caminho do irrestrito e, até mesmo, do impositivo. A título de informação subsidiária, são ainda referidas questões que a pandemia da COVID-19 trouxe consigo, além de uma precisão de conceitos que ajude a não confundir eutanásia com ortotanásia, de forma a contribuir para um diálogo profícuo, a partir de uma consideração antropológica, ética e cristã da eutanásia.